sexta-feira, março 26

Os quatro sentidos do toque

O que é que vês quando me tocas?
A que é que te cheira quando o fazes?
O que ouves quando o percorres?
A que te poderá saber?
Diz-me agora que quanto ao sentir já tenho resposta!
Que não sentes nada à muito que estou cansado de perceber...

Certas vezes a culpa foi minha,
Outras vezes tua,
Outras dele,
Mas nunca foi nossa!
Não podemos ter culpa por gostarmos um do outro.

Houve dias em que fui eu,
Ouve dias em que foste tu,
Outras ele,
Mas nunca houve dias em que fomos nós!
Nunca sacámos das armas ao mesmo tempo e apontámos um ao outro.

É verdade, fui eu que quis,
É verdade, foste tu que quiseste,
É verdade, se calhar foi ele que quis,
Mas não fomos nós que quisemos!
Como tiveste coragem de dizer eu quero à vontade de outro?

E se eu o desejei,
E tu o desejaste,
E se ele o desejou,
Mas será que nós o desejámos?
Aos teus lábios o perguntei, e assim foste responder a outro...

quinta-feira, março 4

Noites em branco

Tal como os grandiosos guerreiros de outrora que em campos de batalha acabaram por tombar, da mesma forma um borrão de tinta sobre as folhas da minha consciência assim foi acabar.
Malditas insónias que de branco não têm nada.

As desilusões mancham-me o papel virgem, os lençóis impuros, o edredão conspurcado, as paredes coscuvilheiras, o tecto trabalhado, onde violentas pingas sem piedade ao chão fazem questão de esmurrar, levando-me então avassaladoras pegadas deixar, quando ao abrigo do desespero me levanto para mais um tresmalhado copo de água à boca levar.
Maldita tinta que mais te assemelhas a uma pessoa.

Abraças-me como uma vadia e afinal tens poiso onde matar o ócio, tal como as pessoas, que por mais que andem à tuna acabarão por debaixo de um pedaço de terra se deitar, tal como tu, que por mais interesse que me possas despertar, acabas pelo encanto de uma noite me tentar enganar.
Maldita noite que teimas em não virar dia.

Mas o dia vai chegar, e com ele serás obrigada a mostrar-te. Seca sobre aquilo que te decidiste atirar, oh mulher, terás força para um última coisa dessa tua infame boca soltar:
Maldito sejas tu, que a mim decidiste deixar de amar.

quarta-feira, março 3

Da solidão

Nós nunca vivemos realmente acompanhados, nem mesmo numa relação. Mesmo quando nos vimos, e até nos podemos vir ao mesmo tempo, vimo-nos nós, por nós, e é de nós que se esvai o bestial e saboroso sentimento de prazer. De cada um de nós.

Pois então como vieste, agora vai-te. Talvez te venhas a sentir com falta de alguma coisa.